quarta-feira, 28 de maio de 2014

A história de um Louco

por Sérgio Bronze

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E aquele homem que caminhava erraticamente pela terra, seguindo seus instintos de sobrevivência como qualquer outro animal na natureza, sem maiores preocupações além da de satisfazer suas necessidades básicas de cada dia, apoiado ou cativando a natureza, pode ele mesmo atingir os mais altos pináculos do universo. Primeiro, ele começou manipulando pequenos objetos que ele dispunha diante de si e com o auxílio de alguma inteligência ele percebeu que poderia criar coisas novas e úteis, e ele se regozijou em si mesmo.

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Aquele homem reconheceu a inteligência nele e aos poucos vou desenvolvendo diversas culturas. Desenvolveu a escrita, a ciência e a tecnologia, mesmo que todas elas estivessem subordinadas a alguma religião. Ainda assim, ele continuava sem saber direito o que fazer com tudo isto que ele ia aos poucos descobrindo. Assim, depois de muito tempo ele percebeu que poderia utilizar destas quatro coisas como instrumento de poder e todo incentivo para estas artes era no intuito de obter poder sobre outros.

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Quanto mais poder e força a sua inteligência adquiria, mais ele se perdia na direção de seus reais objetivos. Sua violência ocasionada pela tentativa de manter o poder adquirido o fazia regredir de sua condição humana. Toda violência gera uma reação contrária e este homem percebeu, pelo refinamento de sua inteligência, que poderia haver outra maneira de obter o poder e o amor dos homens. Ele então descobriu a mística da manipulação da mente e das paixões humanas, e, agora, com a suavidade das palavras certas ele obtinha o poder sobre todos sem a necessidade de uma violência aparente.

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Desse refinamento do pensar e no agir, pode aquele homem descobrir os mais sublimes sentimentos humanos. Ele desenvolveu novos conceitos e pensamentos, mas até mesmo perante tais sentimentos, ele se percebia dividido; ele se percebia insatisfeito e incompleto, por mais que estes sentimentos fossem completos em si. Então ele buscou aquele algo maior e quando o atingiu ele percebeu qual era a verdadeira realeza humana oculta em cada um e ele tentou ensinar sobre ela. Todos os seus esforços eram na direção da verdade, mas a humanidade ainda estava lá atrás e para ela a verdade era violência e guerra: e desta maneira a verdade foi ensinada. Ainda houve muitos que, ainda mergulhados nas ideias místicas, acreditaram que se falava de algo acima dos homens.

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Por causa deste desequilíbrio é que foi necessário desenvolver leis que regulassem aquilo que estava abaixo e que buscava imitar aquilo que estava acima. Este homem acabou por descobrir que havia uma lei ainda maior que o obrigava a viver em harmonia consigo e com toda a criação. Acabou por descobrir que ele não era o centro do universo, assim como as estrelas não giram ao redor da terra, mas que esta move em harmonia por uma lei maior e precisa. Desta solidão nasceu a consciência divina nele e isto era algo grande demais para ser mantida em silêncio, e em mais uma tentativa de auxiliar a todos ele se expos e esperou que a sua experiência servisse de exemplo e de estímulo para os demais. Mesmo assim, muitos acharam que ele estava ainda mais louco.

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Assim, a humanidade na busca de riquezas iniciou uma espiral de torturas, na busca de uma felicidade material que a faz caminhar em um mundo de inconstâncias. Ela sonha com uma felicidade que se esconde dela e passou acreditar que a velocidade e estabilidade são os caminhos mais perfeitos. Por conta disto, ela começou a ver demônios em toda parte e em um ato de total insanidade, provocada pelo sofrimento, também passou a acreditar em demônios regendo as suas existências. Mas aquela consciência superior que aquele louco falara, tenta a cada dia apaziguar os instintos bestiais humanos. Ela tenta mostrar o caminho perfeito em direção ao futuro, mostrando onde se encontra a verdadeira felicidade. Onde a eternidade encontra a felicidade através do amor.

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Muitos homens movidos pelo desconhecimento do que é o verdadeiro amor, acreditaram que o sofrimento extremo seria o caminho para a libertação de todos os males que afligem o ser humano. Eles, em um total ato de selvageria contra a natureza iniciaram atos de total selvageria: uns contra os outros. Acreditaram que o sacrifício da carne e do mundo material seria a fórmula de sua salvação. Eles abandonaram tudo de real valor por um falso sentimento de um amor antinatural: mas isto teve de ser assim mesmo. Isto tudo ocorreu pelo conhecimento da morte e de ideias errôneas sobre ela. Assim, e não de outra causa, o amor e a morte se tornaram nos fantasmas que assolavam o imaginário. Maldito ego! Maldito demônio que habita cada louco!

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Por causa do demônio, o louco desenvolveu uma série de artes na tentativa de prolongar a sua existência. Ele desenvolveu drogas e poções que pudessem levá-lo ao conhecimento de alguma fuga daquilo que é inevitável. Criou quimeras e mitos que muitos acreditaram ser verdade. Disse conhecer uma fonte da juventude, mas que não sabia ao certo onde ela ficava, por isso que muitos foram os lugares na terra erguidos em nome desta fonte, no formato de templos. Sim. Agora a confusão estava definitivamente formada e o demônio era o senhor e guardião desta fonte da juventude, onde alguns disseram que lá haviam bebido, mas que não conseguiram ser aquilo que diziam ser.

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Então as guerras dominaram a terra, pois aquele louco desejava conquistar as riquezas dos outros. Por causa disso, a vingança se tornou generalizada e geração após geração conheceu a destruição. Nações se voltaram contra nações; homens marcharam para a sua queda; casa foram queimadas até as cinzas; crianças foram marcadas pelo ferro das armas; e tudo se repetia incessantemente. Um dia nada mais restou e a terra ficou vazia, o silêncio da noite ocupou a terra e o louco teve de reconstruir tudo novamente. Ele usou a água e a argila para construir suas casas, e muitos morreram de frio.

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Ele em sua solidão compreendeu que ele havia sido abandonado da ideia de deuses e demônios, e que estava em suas mãos a responsabilidade de seu destino. Finalmente, compreendeu que sua jornada contaria apenas com aqueles que porventura estivessem ao seu lado e isto lhe foi uma grande revelação. Sim. Ele atingiu a grande revelação de que o mundo e tudo nele eram seus companheiros, que não havia nada que estive ali para se opor a sua caminhada. Nem mesmo nele haveria algo que estivesse deliberadamente contra ele, e tudo aquilo que lhe havia sido roubado, pela sua ignorância, lhe foi devolvido.

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Pode aquele louco vislumbrar a si mesmo e afastar dele todas as ilusões da diferença entre o alto e o baixo, entre o claro e o escuro... Ele mesmo pode se transmutar naquilo que ele sempre foi desde o princípio. Compreendeu que nele sempre estiveram as respostas para todas as verdades e que não adiantava querer conhecer algo sem estar preparado para suas respostas. Por isso ele sabia agora que não adiantou querer ou bater na porta da verdade, se as perguntas não eram feitas corretamente. Enfim, ele retornou alegre e definitivamente para aquele que sempre foi o seu lar e do qual nunca deixou de estar.

Um comentário:

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